Alaíde foi a primeira vereadora da Câmara Municipal de Belo Horizonte (1949 a 1951)

Falar de Alaíde Lisboa de Oliveira, primeira vereadora de Belo Horizonte, é algo complexo, mas também simples. Complexo, porque, sendo uma mulher notadamente à frente de seu tempo, protagonizou ações e acumulou títulos até então impensáveis – nas primeiras décadas do Século 20 – para uma figura feminina, alcançando o reconhecimento das mais altas autoridades acadêmicas e governamentais do estado e do país. E, simples, porque essa menina, nascida aos 22 dias de abril de 1904, na pequena Lambari, Sul de Minas, cultivou sempre, ao longo dos seus 102 anos de vida, a mesma simplicidade austera da família em que nasceu.

Seu pai, João de Almeida Lisboa, nascido em 1870, em Macaé, no Estado do Rio de Janeiro, era farmacêutico licenciado e, em 1890, mudou-se para a pacata Águas Virtuosas de Lambary para auxiliar o único farmacêutico daquela povoação, local que seria promovido a município onze anos depois, em 1901. Com o passar do tempo, com sua inteligência e trabalho, tornou-se proprietário da farmácia J. Lisboa e Cia. e, com sua capacidade de oratória, acabou entrando para a vida política da cidade como vereador, depois prefeito, até chegar a deputado estadual e à presidência da Assembleia Legislativa mineira, passando, antes, por um mandato de deputado federal, entre 1924 e 1930. Posteriormente, durante o período do Estado Novo, exerceu o cargo de conselheiro no Conselho Administrativo do Estado (que se transformou depois em Assembleia Legislativa), chegando a ocupar sua presidência até 1947, quando faleceu. 

Sua mãe, Maria Rita de Vilhena Lisboa, de família tradicional e de vida política em Lambari, deu à luz quatorze filhos, dos quais nove sobreviveram, muitos deles vindo a se destacar na vida social, política e literária da região, de Minas e do Brasil, como Alaíde, seu irmão José Carlos Lisboa, escritor e poeta, e sua irmã, a escritora Henriqueta Lisboa, autora de vários livros infanto-juvenis. 

Alaíde Lisboa passou sua infância e juventude em Lambari, mas, em 1924, transferiu-se, com a família, para o Rio de Janeiro, acompanhando o pai, que assumiria vaga na Câmara dos Deputados como deputado federal. Com a cassação do mandato de João Lisboa, em 1930, a família retornou a Lambari e Alaíde passa a dar aulas no Grupo Escolar. 

Bodas de Ouro dos pais de Alaíde - 1943

Em 1934, o pai de Alaíde é eleito deputado à Constituinte Mineira e a família se transfere novamente, desta vez para para Belo Horizonte, onde permanecerá pelas décadas seguintes. Na Capital, Alaíde entra para o Curso de Aperfeiçoamento Pedagógico de Minas Gerais e, na mesma época, conhece o Professor José Lourenço de Oliveira, com quem se casaria, em 22 de agosto de 1936 e com quem teria seus quatro filhos – Abigail, Maria, Sílvio e José Carlos. 

Unidos pelas Letras, amantes da Literatura e da Filosofia e entusiastas da Educação, Abigail e José Carlos se destacam, sempre juntos, no meio acadêmico. 

Ele, ex-aluno do Caraça, Professor de Português, Francês e Latim, Professor de Filologia Românica, torna-se jornalista e conferencista, forma-se em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais e pratica a advocacia, funda colégios e faculdades, eleva-se a Catedrático em Linguística da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UFMG, Livre-Docente em Direito Romano, Conselheiro Universitário e Professor Emérito da mesma Universidade Federal. 

Ela, normalista do Colégio Sion, em Campanha, Sul de Minas, aprendeu o francês clássico decorando poemas e trovas, mas também as técnicas didáticas que moldaram sua missão como educadora. Ainda em Lambri, como professora primária, descobriu-se escritora ao publicar, no início da década de 1930, o primeiro dos seus muitos artigos em revistas especializadas.

Alaíde no Colégio Sion, em Campanha, Minas Gerais

Já em Belo Horizonte, para onde se mudara com a família em 1933, aperfeiçoou-se em Pedagogia, sendo aluna de renomadas educadoras, como Helena Antipoff e Lúcia Casasanta, momento em que reforçou suas convicções de que “às pessoas não bastam inteligência e cultura sem a ação de levar o conhecimento que se tem aos demais”. 

Em 1938, Alaíde se tornaria nacionalmente conhecida por suas primeiras obras literárias – “O bonequinho doce” e “A bonequinha preta”, livros que marcaram as gerações de crianças em todo o Século 20 e até os dias atuais, com mais de dois milhões de exemplares vendidos. O primeiro livro didático veio um ano depois – “A poesia no curso primário”, reunindo trabalhos de poetas renomados com potencial de atingir também as crianças, como Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meirelles, Manuel Bandeira, Vinícius de Moraes e Henriqueta Lisboa (sua irmã).

Como jornalista, escreveu por quinze anos no jornal “O Diário”, na seção “Vida escolar”, e dirigiu, entre 1948 e 1961, o “Diário do Pequeno Polegar”, um suplemento infanto-juvenil que abordava a cultura voltada para crianças, além de histórias populares do folclore brasileiro, sem se esquecer da poesia e dos contos. 

Em 1947, já como professora de Português e Socialização da antiga Escola Normal Modelo (atual Instituto de Educação), assume a presidência da Associação dos Professores Púbicos de Minas Gerais. Nesse mesmo ano, animada com o retorno da democracia ao Brasil, Alaíde decide entrar para a vida política e aceita ser primeira suplente do candidato a vereador Octacílio Fonseca (PTN), recebendo muitos votos dos professores.

Com alunos do Curso de Fomação de professores do Ensino Comercial

Em 1949, com a renúncia de Octacílio Fonseca, Alaíde Lisboa de Oliveira se torna primeira mulher a atuar como vereadora em Belo Horizonte. Com seus contatos políticos, ela garante a efetivação da carreira do Magistério no âmbito municipal e um significativo aumento de salário para os professores. Ainda na Câmara Municipal da Capital mineira, Alaíde propôs a criação da Casa de Cultura, a fundação e instalação do Colégio Municipal e a expansão da rede municipal de ensino, sobretudo nas áreas de periferia. Com o fim de seu mandato, em 1951, decidiu não continuar na vida política, incomodada com as imposições burocráticas do partido. Ela queria continuar lutando em prol da Educação no município, mas entendeu que, como costumava dizer, “apoio integral e oposição integral criam, às vezes, problemas de consciência”.

Vídeo "Memória e Poder" - TV Assembleia

Nos anos 1950 lecionou Didática Geral e Especial como professora-assistente da Faculdade de Filosofia da Universidade Católica de Minas Gerais e tornou-se professora na graduação e pós-graduação na Universidade Federal de Minas Gerais, nas faculdades de Filosofia, de Educação e de Medicina. Foi também fundadora e diretora do Colégio de Aplicação da UFMG, período em que também conquistou Doutorado em Didática. Em 1959, assumiu, por concurso, a Cátedra de Didática Geral e Didática Especial de Português e Literatura na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Federal de Minas Gerais. 

A professorinha da pequena Lambari também representou Minas Gerais na Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil e integrou o Conselho Universitário da UFMG, onde, em 1971, organizou e coordenou o curso de mestrado em Educação da Faculdade de Educação. Alguns anos depois, assumiu a Vice-Diretoria da Faculdade de Educação da UFMG, ocasião em que lançou o livro “Nova Didática”, elogiado por Carlos Drummond de Andrade. 

O título de Professora Emérita da Universidade Federal de Minas Gerais foi recebido por ela em 1978, dois anos depois de ter conquistado o reconhecimento público de sua importante atuação no desenvolvimento da Educação em Minas e no Brasil, com o título de Cidadã Honorária, concedido pela Câmara Municipal de Belo Horizonte. Outros prêmios se seguiram, como a Placa “Amiga do Livro”, concedida pela Câmara Mineira do Livro, em 1982, e a Medalha Helena Antipoff, pela Prefeitura de Belo Horizonte, em 1985.

Reconhecimentos ainda mais amplos viriam a seguir, com sua eleição para a Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, em 1986; para a  Academia Feminina Mineira de Letras, em 1988 e, finalmente, em 1995, com sua indicação à Academia Mineira de Letras, onde experimentou a alegria de ocupar a Cadeira de número 6, antes pertencente a seu irmão José Carlos Lisboa.

Em sua trajetória exemplar, Alaíde Lisboa jamais se desviou de sua meta como educadora, muito menos de seus princípios. Acreditava na responsabilidade do professor sobre o desenvolvimento de cada aluno em particular e praticava, com ternura, o respeito ao ritmo de cada criança e adolescente em sala de aula. Seu método de ensino animou gerações de alunos a também se tornarem professores, pesquisadores, acadêmicos. Principalmente, gerou neles o fascínio pela literatura. 

Alaíde Lisboa de Oliveira publicou dezenas de livros, muitos deles ensinando a seus alunos como ensinar. Mas sua grande paixão eram mesmo as crianças, às quais dedicou boa parte de sua produção literária. Começando com “O Bonequinho Doce” e com “A Bonequinha Preta”, ela desenvolveu histórias que fizeram parte do imaginário da meninada por muitas e muitas décadas, histórias que são contadas até hoje em muitas escolas a partir de outros de seus livros, como a série didática “Meu Coração” e as obras “Ciranda”, “Gato que te quero gato”; “O avião de Alexandre”; “Como se fosse gente”; “Recontos das fábulas de Fedro”; “Cirandinha”; “Mimi fugiu”; “Simbad, o marujo” e “Era uma vez um abacateiro”, entre várias outras. 

Seu último livro, uma autobiografia em prosa e verso intitulada “Se bem me lembro...” foi lançada pouco antes de seu centenário, em 2002. Até o final de sua produtiva vida, em 4 de novembro de 2006, a professora Alaíde Lisboa de Oliveira jamais desviou de seus princípios e de seus sonhos, acreditando, com todas as suas forças, que somente por meio da Educação e da Cultura é possível construir uma sociedade melhor e mais consciente. 

Por tudo isso e muito mais é que Alaíde Lisboa de Oliveira é agora uma das nossas “Mulheres na Memória”. 

 

Maria Berenice Rosa Vieira Sobral

Seção de Memória Eleitoral / CGI / SGG

2024

Vídeo "Memória: Alaíde Lisboa" - MIS

Vídeo do servidor Wellerson Rubens de Amarante - Exposição " Mulheres na Memória "

No cenário político e intelectual do Rio de Janeiro nos anos 1920 e 1930, a jornalista e escritora Anna Amélia se destacava na defesa do direito das brasileiras ao voto e ao ensino superior. Como colunista dos jornais “O Globo”, “O Jornal”, “Diário da Noite”, da revista “O Cruzeiro”, e, em especial, como diretora do Suplemento Feminino do “Diário de Notícias”, seus artigos impactavam a sociedade e inspiravam novos ares à cultura social e política da época.

Em 1935, como vice-presidente da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino e membro da Associação Cristã Feminina, ela foi indicada pelo então Presidente Getúlio Vargas para representar o Brasil no XII Congresso Internacional de Mulheres, em Istambul/Turquia. Em 1942, Anna Amélia voltou a representar oficialmente o Brasil, desta vez na Conferência Pan-Americana da Mulher, em Washington/EUA. Já em 1967, a convite do Estado de Israel, representou a mulher brasileira em Jerusalém, no Congresso Internacional Feminino pela Paz e Desenvolvimento.

O ativismo dessa inquieta carioca venceu barreiras que pareciam intransponíveis para as mulheres de sua época. Seu amor pela Educação e, em particular, pela História, levaram Anna Amélia a atuar em várias associações e instituições culturais, como o Instituto Brasileiro de Educação Ciência e Cultura; o Instituto Histórico de Ouro Preto e o Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Amante das Artes, integrou também a Associação dos artistas Brasileiros, a Sociedade Americana de Escritores e Artistas de Havana; a Sociedade Brasileira de Cultura Inglesa e dos institutos Brasil-Estados Unidos, Brasil-Chile e Brasil-Bolívia.

O ano era 1934 e a recém-criada Justiça Eleitoral finalizava, em todo o país, os preparativos para as eleições de 14 de outubro, quando seriam eleitos deputados federais e deputados constituintes estaduais. No dia 4 de outubro, o Diário Oficial publicou os nomes dos integrantes das turmas apuradoras, e foi então que Anna Amélia de Queiroz Carneiro de Mendonça acabou se tornando, como escrutinadora, a primeira mulher a atuar na Justiça Eleitoral. 

Esse momento histórico na vida de Anna Amélia representou mais uma vitória na luta das mulheres pela participação na política e na vida social como um todo. Em 1932, as mulheres haviam conquistado o direito ao voto e as eleições de 1933 indicaram duas foram as mulheres para a Assembleia Constituinte. 

A participação de Anna Amélia como escrutinadora nas eleições de 1934 foi o reconhecimento, pela Justiça Eleitoral, de sua forte atuação pelo sufrágio feminino ao longo das décadas de 1920 e 1930, como jornalista, escritora e ativista pelas causas sociais ligadas às mulheres. 

Atuando fortemente na Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, Anna Amélia continuou lutando e incentivando outras mulheres a ingressarem nas frentes políticas. Nas eleições de 1934, ela e suas companheiras tentaram eleger a paulista Bertha Lutz para a Constituinte Estadual por São Paulo. Com sua singular influência junto às elites políticas da Capital Federal, Anna Amélia também atuou para pressionar parlamentares a incluírem, na Constituição Brasileira, mais direitos para as mulheres. Ela também promoveu uma convenção nacional na Bahia, buscando modernizar a estrutura da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, objetivando transformá-la em uma organização nacional de grande porte.

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