Primeira vereadora de Belo Horizonte - Alaíde Lisboa

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Alaíde Lisboa - primeira vereadora de Belo Horizonte

Setenta e cinco anos atrás uma mulher assentava-se, pela primeira vez, na Câmara Municipal de Belo Horizonte, mais precisamente no dia 18 de julho de 1949.

Esse pequeno trecho da longa história da Professora Alaíde Lisboa de Oliveira, no entanto, começa dois anos antes, em 1947. O Brasil enfim respirava ares democráticos. Em 1945, a Justiça Eleitoral tinha sido reinstalada, em 1946 a nova Constituição havia sido promulgada e, em 1947, novas eleições seriam realizadas nos estados e municípios.

Os pleitos aconteceriam em janeiro, abril e novembro. Em janeiro, para governador, 1 senador, 1 suplente de senador, 2 suplentes dos senadores eleitos em 1945 e 3 deputados federais; em abril, para 72 deputados estaduais para a Constituinte Estadual, e, em novembro, para vereadores e prefeitos.

Em Belo Horizonte não se falava em outra coisa: a Capital, que festejava seus 50 anos naquele ano, teria seu primeiro prefeito eleito. Otacílio Negrão de Lima, que já havia governado a cidade como interventor, durante o Estado Novo, queria ser esse prefeito, tendo seu sonho plenamente realizado.

Amigo da família, Otacílio Negrão de Lima convidou Alaíde a também entrar para a política. Naquela época, ela presidia a Associação dos Professores de Minas Gerais e, pensando na categoria, filiou-se ao PTN aceitou a proposta e o partido a colocou, então, como suplente do candidato a vereador Octacílio Fonseca. Com os muitos votos recebidos dos colegas do Magistério, o vereador e a suplente foram eleitos.

Em 1949, com a renúncia de Otacílio Fonseca, Alaíde Lisboa de Oliveira assumiu a cadeira na Câmara Municipal, com todos os holofotes possíveis. Sua posse foi noticiada em todos os jornais de grande circulação do Estado. Focada no trabalho, porém, a vereadora Alaíde, aos 45 anos, só pensava em efetivar seus projetos para a melhoria da Educação em Belo Horizonte. E conseguiu: expandiu a rede de ensino, em especial, nas periferias, efetivou a carreira do Magistério e conseguiu aumento de salário para os professores. Desejava ter feito muito mais. Seus projetos culturais eram variados, mas ela acabou por desistir da política por questões pessoais.

Em seu último livro “Se bem me lembro...”, lançado em 2002, no ano de seu centenário, Alaíde Lisboa de Oliveira recordou, no poema-prosa “Vereança”, algumas das situações vivenciadas logo após ter sido eleita como primeira suplente de vereador, em 1947, e, em especial, durante seu mandato, entre 1949 e 1951, como primeira (e única, até então) mulher entre os 23 vereadores da primeira legislatura da Câmara Municipal de Belo Horizonte.

Reproduzimos, aqui, alguns dos trechos em prosa de “Vereança”:

“Antes de exercer a vereança, como primeira suplente, fiz parte da Comissão da Casa Popular, e pude ver o trabalho constante do Prefeito na fiscalização pessoal das obras, sempre preocupado com a distribuição das casas (...) Na primeira audiência, o Prefeito, que alias era grande realizador, Pioneiro do Movimento pela Casa Popular, Dr. Octacílio Negrão de Lima, ouviu meus planos e advertiu:

_ “Alaíde, Roma não se fez num dia”.”

“Certa vez o Presidente da Câmara foi à minha casa sugerir que eu não comparecesse à reunião daquela noite (as sessões eram à noite, porque os vereadores tinham profissão a exercer durante o dia, repito, a política era missão). Esperava-se um grupo de esquerda, de fora, que vinha discutir problemas na Câmara, o ambiente seria muito carregado, poderia haver manifestações violentas entre a esquerda e a direita; clima não favorável a uma dama. Agradeci a atenção e respondi que eu era mulher, mas que era também vereadora e tinha de enfrentar problemas. Compareci à reunião; as divergências foram serenas. Quem sabe se a presença feminina tranquilizou o ambiente?”

_ “Não quis continuar na política? Por quê?

_ Fui até convidada para ‘entrar na chapa’ (como se dizia na época) de deputada estadual pelo PRM, mas a minha pequena experiência me demonstrou que não era fácil conciliar a autonomia pessoal com as diretivas partidárias. Não era possível limitar-me aos problemas educacionais. Surgia, por exemplo, a resolução de cassar o mandato de um vereador, por quê? Por razões burocráticas a serviço de interesses políticos; apoio integral e oposição integral criam às vezes problemas de consciência”.

“Os ideais no fazer, no realizar, são às vezes interrompidos por motivos particulares. O que me incomoda na democracia é o valor exagerado à quantidade de votos; enquanto a qualidade, não apenas dos votantes, mas das ideias votadas perde para a quantidade. Consta que Milton Campos dizia que a Democracia é péssimo regime, mas ainda é o melhor que existe. Alguns criativos poderão aperfeiçoar a democracia na teoria e na prática! E aperfeiçoar os democratas”.

Já sob o título “Renovação Política”, Alaíde Lisboa de Oliveira relembra, em forma de prosa, as palavras que disse, a partir da Tribuna, quando tomou posse como vereadora na Câmara Municipal de Belo Horizonte e que ela descreveu como “a oração da ilustre educadora, primeira representante feminina a participar da edilidade da Capital”:

“A nossa participação no Legislativo Municipal representa dupla experiência: experiência feminina e experiência pessoal. Queira Deus possa ser proveitosa”.

“Notamos, por exemplo, que a preocupação de agradar o povo, muitas vezes, na vida política, se sobrepõe à preocupação de servir o povo, e, como resultado, os atos praticados podem ter bela aparência e pouca eficácia”.

“Mais grave ainda – felizmente num círculo bem limitado – é a grande preocupação de que os atos pareçam honestos e a menor preocupação de que o sejam realmente”.

“Devemos vigiar-nos e combater com sinceridade esse espírito de mistificações, de ambições desnorteadas, de satisfações personalistas, de exploração das forças do próximo em benefício próprio, de apego aos prazeres” (in O Diário, 20.07.1949).

 

Maria Berenice Rosa Vieira Sobral

Seção de Memória Eleitoral / CGI / SGG

18 abril de 2024